quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

1924


O espírito de desmoralização ergueu domicílio, é com ele que tratamos sempre que há problema de relação com nossos semelhantes, mas se as portas estão sempre abertas sabeis que  não se  começa"agradecendo" às pessoas. De mais a mais, a solidão é vasta, não nos encontramos muito. Pois o essencial não é sermos senhores de nós mesmos, das mulheres, do amor também? 

Mas este castelo cujas honras lhe faço, tem ele certeza que seja uma viagem? E se não obstante, o palácio existisse? Meus hóspedes estão aí para responderem por isso; seu capricho é a estrada luminosa que aí conduz. Vivemos de fato à nossa fantasia, quando estamos lá. E como o que um faz poderia incomodar o outro, ali, ao abrigo da procura sentimental e dos encontros ocasionais? 

O homem põe e dispõe. Depende dele só pertencer-se por inteiro, isto é, manter em estado anárquico o bando cada vez mais medonho de seus desejos. A poesia ensina-lhe isso. Traz nela a perfeita compensação das misérias que padecemos. Ela pode ser também uma ordenadora, bastando que ao golpe de uma decepção menos íntima se tenha a idéia de tomá-la ao trágico. Venha o tempo quando ela decrete o fim do dinheiro e parta,  única, o pão do céu para a terra! Haverá ainda assembléias nas praças públicas, e movimentos dos quais não pensaste participar. Adeus seleções absurdas, sonhos de abismo, rivalidades, longas paciências, a evasão das estações, a ordem artificial das idéias, a rampa do perigo, tempo para tudo! Basta se Ter o trabalho de praticar a poesia. Não é a nós que compete, que já vivemos dela, o esforço de fazer prevalecer o que guardamos para nossa mais ampla inquietação? 

A verdade é que agora uma flecha indica a direção destes lugares e que alcançar a meta verdadeira só depende de resistência do viajante.

In: Manifesto Surrealista

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